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quarta-feira, 4 de agosto de 2010

Responsabilidade de Empresa Concessionária de Transporte Público Urbano e Aplicação Prática de Um Caso Pontual


A necessidade do justo para aplicação de responsabilizações decorrentes de um mesmo fato – análise pontual

Responsabilidade de Concessionária de Serviço Público por Acidente de Ônibus Quanto aos Usuários e aos Seus Empregados


Escrevo essas breves palavras após ter sido questionado sobre um caso prático. A questão envolvia um acidente de trânsito com um ônibus de concessionária de transporte público urbano e suas implicâncias jurídicas. Esse caso polêmico também já foi objeto de prova de magistratura trabalhista, o que desperta ainda mais o interesse pelo tema. Espero que gostem e aguardo os comentários, que é o que nos dá ânimo para continuar "blogando". Razão pela qual, desde já, agradeço!

Houve grave acidente automobilístico envolvendo um ônibus com vinte e dois passageiros e dois empregados (o motorista e seu ajudante) da empresa de ônibus. Todos ficaram gravemente feridos, embora não tenha ocorrido nenhum óbito. A empresa de ônibus cumpriu todas as normas cíveis e de segurança e medicina do trabalho em relação às suas atividades e do próprio veículo acidentado. Especifique a responsabilidade da empresa de ônibus pela indenização aos passageiros e aos seus dois empregados, pelos danos patrimoniais e morais sofridos, estes últimos decorrentes das sequelas do sinistro.

A noção de responsabilidade civil está intimamente ligada a ideia de reparação de danos sofrido pela vítima. No caso em questão, recairá, indubitavelmente, a aplicação da teoria da responsabilidade civil, aplicando-se inicialmente as regras constitucionais e dos arts. 186, 187 e 927 do Código Civil, pois ocorreram danos graves em diversas pessoas, decorrente de acidente envolvendo veículo de uma concessionária de serviço público de transporte.

No caso em questão, mister inicialmente observar que há dois tipos de relação jurídica, a saber: a relação de consumo entre os passageiros e a empresa concessionária, ligados por um contrato de natureza eminentemente civil e, de outra banda, a relação jurídica laboral, ligados por contrato de trabalho entre os empregados e a empresa de ônibus. Como decorrência disso, a resposta deverá ser dividida em duas partes distintas.

Em se tratando de concessionária de serviços de transporte público, é de se observar a regra constitucional estabelecida no art. 37, §6º da CF, ou seja, a responsabilidade objetiva para os usuários da prestação de serviços, mesmo que tal prestadora seja ente privado.

Em linha de raciocínio, para os usuários da prestação de serviço, aplica-se o citado dispositivo constitucional, por decorrer o serviço de delegação direta do estado. Para os passageiros do ônibus, portanto, há possibilidade de indenização, bastando para tanto, a comprovação do fato, dano e seu nexo causal como decorrência da aplicação da responsabilidade objetiva ocorrida dentro do contrato de prestação de serviço de transporte para cada um dos usuários.

Em arremate, não se olvida que, além do argumento constitucional, há no art. 734 do CC, previsão expressa de responsabilidade objetiva do transportador perante as pessoas transportadas e suas respectivas bagagens.

Com relação à possibilidade de reparação dos empregados pela empresa concessionária empregadora, no caso concreto, é preciso ser estabelecido, inicialmente, se o acidente de trabalho decorre de responsabilidade contratual ou extracontratual.

È preciso destacar, previamente, que o sistema de responsabilização por acidente de trabalho leva em consideração não só se a indenização decorre da relação contratual ou não, mas também, principalmente, se decorre da responsabilidade objetiva ou subjetiva.

A análise do caso concreto é que definirá em qual das espécies irá se enquadrar a indenização e para cada uma haverá implicâncias consequenciais inerentes ao instituto. No sistema atual, há a coexistência das espécies de responsabilização objetiva ou subjetiva, devendo uma delas ser aplicada no caso concreto.

A corrente amplamente majoritária, defende que a indenização por acidente de trabalho enquadra-se como responsabilidade extracontratual por ser decorrência de ato ilícito não previsto no contrato, estando previsto sim nas normas gerais. Por essa corrente, a responsabilidade não tem natureza contratual pois no contrato de trabalho não há cláusula prevendo a garantia de integridade física e moral do empregado.

Concordo com a regra geral, pois é corrente facilitadora da aplicação da responsabilidade objetiva nos casos de acidentes decorrentes do meio ambiente do trabalho, interpretação de acordo com os arts. 225, §3° e 200, VIII da CF e da teoria do risco, paragrafo único do art. 927 do CC.

Para o caso em tela, haverá a incidência da teoria do risco para os empregados, não havendo que se falar em dano decorrente do meio ambiente do trabalho, pois não está em análise questões poluidoras ou perigosas.

Continuando, destaco que aplico a teoria do risco apenas aos empregados e não aos passageiros, pois a esses recaem regras de responsabilização específicas estabelecidas em lei, conforme legislação já citada e a fim de evitar a banalização da teoria do risco, pois a sociedade moderna se baseia, em suas regras consagradoras de convivência, nos transportes, sendo situações muito amplas.

O simples fato de locomoção do indivíduo leva a ideia de transporte, quer seja em elevadores, trens, automóveis e até a locomoção por pedestres. Ora, isso não pode ser enquadrado como risco, sob pena de se incluir tal teoria até mesmo pelo fato dos indivíduos estarem vivos. Não é isso, definitivamente, que a teoria do risco defende, pelo contrário, sua aplicação ocorre sim em casos específicos e plenamente justificados, como exemplo, o transporte de gases envazados e o caso em análise com relação aos empregados, conforme será analisado a seguir.

Os empregados da empresa prestadora de serviço público de transporte que lidam diariamente e diretamente com o transporte de passageiros estão enquadrados em atividade de risco em virtude da atividade expor os empregados a uma maior probabilidade de sofrerem acidentes, comparando-se com a média dos demais indivíduos. Por isso a exclusão dos passageiros, pois estes são transportados por um certo período não comparável com a jornada dos empregados dentro do meio de transporte.

È de se levar em conta também os altos índices de acidentes de trânsito, como também de assaltos, que são cada vez mais cotidianos. Por esses motivos, conforme o Enunciado 38 da 1ª Jornada de Direito Civil do CJF, entendo que a atividade exercida pelo motorista e seu ajudante no ônibus recai em sua total integralidade na teoria do risco, não sendo necessário para eles a comprovação da culpa do empregador para que sejam indenizados.

Ao fim, ressalto a importância do desenvolvimento da responsabilização objetiva na seara laboral em matéria de acidente de trabalho, mormente nesse caso, pois pensar o contrário, aplicando-se a responsabilidade subjetiva, geraria a não indenização dos empregados pelo fato da empresa ter observado todas as regras de segurança e medicina do trabalho e no mesmo fato e situação haver a possibilidade de indenização de todos os usuários, objetivamente, que convivem muito menos com o risco. Tal posicionamento, seria no mínimo injusto e pouco auspicioso.

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